Representantes dos poderes Judiciário e Executivo cobraram nesta quinta-feira (12) mudanças legais para enfrentar a discriminação racial no trabalho. Eles participaram de audiência pública da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público para discutir as relações de emprego e a promoção da igualdade racial. O debate foi proposto pelo presidente do colegiado, deputado Sebastião Bala Rocha (PDT-AP).
Para a presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 10ª Região (DF e TO), Noemia Aparecida Porto, faltam leis mais claras para punir a discriminação racial nos ambientes de trabalho. "Precisamos de atos legislativos mais completos, mais adequados para aparelhar os magistrados em casos de discriminação", afirmou.
Noemia citou algumas propostas em tramitação na Câmara, como os PLs 3003/11 e 756/11, que definem o conceito de "trabalho decente" e tratam do combate à discriminação dentro da administração pública. Segundo a dirigente, os projetos são válidos, mas insuficientes, pois os principais problemas acontecem na iniciativa privada. "Na iniciativa privada, o critério de contratação é apenas o do empregador. Em uma entrevista, ele pode rejeitar os mais velhos, os não bonitos, as mulheres", argumentou.
O trabalho decente, conforme a Organização Internacional do Trabalho (OIT), é aquele tido como produtivo e adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade de organização sindical e negociação coletiva, equidade e segurança, sem qualquer forma de discriminação e capaz de garantir uma vida digna.
Indicadores
Segundo a gerente de Projetos, Acompanhamento e Monitoramento de Políticas Públicas da Secretaria de Igualdade Racial, Mônica Alves, os indicadores sociais que atestam a diferença entre brancos e negros no mercado de trabalho deveriam ser levados em conta nas decisões judiciais. "Os indicadores expressam o grau de perversidade do racismo no mercado de trabalho brasileiro."
Mônica ressaltou que não é possível fazer promoção da igualdade no trabalho sem enfrentamento do preconceito. "Ainda temos uma situação de fortes desigualdades que mantém homens brancos na primeira posição de emprego e as mulheres negras na última colocação", disse.
Remuneração diferente
O vice-presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Carlos Eduardo de Azevedo Lima, lembrou que os problemas de desigualdade racial afetam o acesso ao emprego, a ascensão funcional e o salário equiparado. "A discriminação é mais gritante quando vemos que há remuneração diferente, para um mesmo nível educacional", declarou.
Lima informou ainda que o Ministério Público do Trabalho começou, em 2005, um programa de conscientização em bancos e supermercados para diminuir a desigualdade racial no trabalho, mas a experiência não foi bem sucedida. "Infelizmente, não obtivemos os resultados esperados. Precisamos de mudança da mentalidade da sociedade como um todo."
Escravidão
Por sua vez, o diretor do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, Valdiney Arruda, afirmou que a população negra é a que mais adoece por condições precárias de emprego e a mais suscetível a trabalho infantil e escravo.
O sindicalista destacou ainda a dificuldade de reintegrar ao mercado os trabalhadores que se encontravam em situações análogas à escravidão. Arruda citou o caso de pessoas negras que foram resgatadas dessa situação e hoje trabalham na construção do estádio de Cuiabá para a Copa do Mundo de 2014. A princípio, disse ele, os operários não foram readmitidos pela empresa de construção – a reintegração ocorreu apenas após uma ação governamental junto à construtora.
Audiências
Bala Rocha enalteceu que a série de audiências sobre o trabalho decente promovidas pela comissão (no mês passado, a discussão teve como foco os empregos domésticos) serve para chamar a atenção da sociedade a respeito do tema e aproximar o Legislativo da agenda da OIT e do governo brasileiro. "Se for mulher, pobre e negra, a dificuldade para conseguir emprego é maior. É por isso que estamos fazendo esse debate", comentou.