Ao manter o prazo para que as empresas passem a fornecer comprovantes dos horários de entrada e de saída de seus empregados, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, só não ficou completamente isolado porque deve contar com o decidido apoio daqueles que parecem os grandes interessados no assunto: os fabricantes dos equipamentos de registro de ponto que, a partir de 21 de agosto, as empresas passarão a utilizar, substituindo os que têm utilizado até agora. A medida vem sendo criticada há tempos por dirigentes empresariais e lideranças sindicais, que a consideram desnecessária e contraproducente para a melhoria das relações entre patrões e empregados.
No dia 21 de agosto do ano passado, o ministro baixou portaria para disciplinar o ponto eletrônico e a utilização do Sistema de Registro Eletrônico de Ponto (SREP), com o alegado objetivo de dar maior certeza na aferição do registro da jornada de trabalho nas empresas com mais de dez empregados e assim combater as fraudes no pagamento das horas extras. A portaria fixou prazo de um ano para as empresas que utilizam o registro eletrônico de ponto se adaptarem às novas regras.
As novas máquinas só podem ser fabricadas por empresas certificadas pelo Ministério do Trabalho e seu preço unitário varia de R$ 2,5 mil a R$ 6 mil. Estima-se que pelo menos 500 mil empresas terão de seguir a portaria, regulamentada por uma instrução normativa publicada na terça-feira passada. É um custo adicional para a atividade produtiva no País, que já enfrenta outros grandes obstáculos para aumentar sua eficiência e competitividade.
Trata-se de um gasto elevado e desnecessário para as empresas. Quanto à defesa dos interesses dos trabalhadores – que, alegadamente, é a razão da mudança -, a eficácia da medida é discutível. Dirigentes da CUT observam que, se a intenção é combater a burla ao pagamento com adicionais das horas extras trabalhadas, o relógio de ponto eletrônico não funciona, pois o empregado, por ordem da empresa, bate o ponto de saída e retorna ao posto de trabalho para cumprir a jornada extraordinária.
Ineficaz para combater a burla, o ponto eletrônico com emissão de comprovante pode tornar-se um elemento perturbador nas relações de trabalho em empresas nas quais, pela maturidade de sua administração e dos dirigentes sindicais, vigoram acordos coletivos que estabelecem direitos e obrigações claras para as duas partes. No ABC paulista, por exemplo, alega o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Sérgio Nobre, as relações trabalhistas estão mais evoluídas e a portaria é um ato de desprestígio para as categorias organizadas e para os acordos coletivos. Esse é um remédio para quem está doente, argumenta Nobre. Ou seja, a medida pode funcionar em empresas que tenham problemas, mas é desnecessária para as demais.
Além de desnecessária, é altamente prejudicial para os trabalhadores e para as empresas. Se for necessário esperar sair o registro do ponto em forma impressa, como está previsto, isso geraria uma grande fila, uma grande acumulação de trabalhadores aguardando a emissão do comprovante, lembrou o secretário-geral da CUT, Quintino Severo. Imagine as filas enormes que vão se formar em uma Volkswagen, em que 10 mil pessoas entram no mesmo horário e hoje têm acesso por qualquer uma das entradas apenas passando o cartão nas catracas, exemplificou o presidente do Sindicato do ABC.
Imagine-se também a quantidade de papéis que cada trabalhador precisará guardar como comprovante de sua jornada de trabalho. Por dia, são no mínimo 4 comprovantes (entrada, saída para almoço, retorno do almoço, saída), se não fizer horas extras. Considerando-se a média de 23 dias úteis, serão 92 por mês. Por ano, quase mil. Serão gastos adicionais com papel, quando se procura reduzir seu uso, por razões ambientais.
Trata-se de uma medida burocrática, ineficiente, cara, incômoda para os trabalhadores – pois retardará desnecessariamente sua entrada e sua saída -, mas que parece encantar o ministro do Trabalho. Por quê?
Fonte: O Estado de SP, em 28/07/2010