Dentro de 20 anos, o Brasil deixará de ser um país que sempre viu sua população crescer para começar um inédito processo de encolhimento. Tudo indica que em 2030 haverá o pico populacional brasileiro, com 206,8 milhões de pessoas. Depois disso, virá o declínio, segundo os estudos.
Em 2040, o país já terá perdido 2,1 milhões de habitantes, entrando num cenário novo. Atualmente, o Brasil tem 185 milhões de habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
As projeções acima foram feitas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e integram uma análise a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), 2009, do IBGE. A tendência de queda na população já fora observada desde 1970. O que se vê, agora, é que o encolhimento e o envelhecimento do país estão muito próximos. Não se trata mais de pensar políticas futuras para enfrentar uma transição que países europeus, por exemplo, levaram alguns séculos para fazer. O Brasil terá que fazer sua adaptação em décadas. A contagem, agora, é em anos, alertam os especialistas.
Mesmo atropelado pelo tempo, em alguns cenários o país vem reagindo de forma surpreendente, observa José Luiz Riani Costa, professor de educação física da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro e vice-coordenador da Unesp-Unati, Universidade Aberta da Terceira Idade.
Um fator importante foi o Instituto do Idoso, de 2003, que consolidou legislações com reflexos nas políticas nacional, estaduais e municipais, desde atividades físicas, culturais, transporte para o acesso a essas atividades, até moradia adequada, previdência e trabalho, afirma Riani Costa.
O Programa Saúde da Família, que atinge quase todo o país e cujos agentes visitam as famílias periodicamente, também é apontado pelos especialistas como uma grande contribuição para prevenir doenças.
Para Ana Amélia Camarano de Mello Moreira, pesquisadora do Ipea, a população que mais cresce é aquela com mais de 60 anos. E, nesse segmento, o crescimento maior está entre os chamados muito idosos, acima de 80 anos, diz a pesquisadora.
A notícia revela um aumento importante na expectativa de vida. Em 2000, por exemplo, eram 14,5 milhões com 60 anos ou mais. Entre elas, 1,8 tinha 80 ou mais. Segundo a pesquisadora, a projeção para 2010 é que o número de pessoas com 60 anos ou mais atinja 20 milhões. Segundo o Ipea, além do envelhecimento da população total, a proporção dos mais idosos está aumentando, ou seja, a população idosa também envelheceu.
Sua participação entre os brasileiros passou de 0,9% para 1,6%, entre 1992 e 2009. Nesse período, a população com mais de 60 anos, que respondia por 7,9%, passou a 11,4%. Dados recentes do IBGE mostram que a expectativa de vida do brasileiro passou de 70 anos em 1999 para 73,1 anos em 2009. Entre as mulheres, saltou de 73,9 para 77 anos. E entre os homens passou de 66,3 para 69,4 anos.
O ano de 2030, apontado como o pico no crescimento populacional, marca também o início de queda da População com Idade Ativa (PIA) – aqueles com 15 anos e mais devem começar a cair a partir daquele ano.
Já a participação do grupo jovem (de 15 a 29 anos), que atingiu seu pico em 2000, tende a entrar em queda a partir deste ano de 2010.
O fôlego ainda vai perdurar graças à participação relativa da PIA adulta (população de 30 a 44 anos). As projeções mostram que esse grupo deve permanecer estável até 2040, mas com acréscimo em valores absolutos.
Ana Camarano lembra que o novo perfil populacional já começa a provocar mudanças no mercado de trabalho. Os novos empregos, por exemplo, deverão se concentrar nas pessoas com mais de 45 anos – faixa etária que deverá ser responsável por cerca de 56,3% da futura População em Idade Ativa a partir de 2030.
Além das questões decorrentes de mudanças no trabalho, duas outras frentes, relacionadas à primeira, merecem cuidados urgentes. Uma delas trata das pressões no sistema previdenciário, que levam à necessidade de manter o trabalhador ocupado pelo maior número de anos possível. Esse novo cenário, lembra a pesquisadora, exige desde a diminuição no preconceito com relação a trabalhadores mais velhos até capacitação para que acompanhem as inovações no mercado.
São desafios também para a saúde e a previdência, pois quanto mais velha a população, mais diminui sua capacidade de gerar renda e a sua autonomia para atividades cotidianas, afirma a pesquisadora. A população está ganhando anos de vida, porém com taxas mais altas de hipertensão, de diabetes, doenças crônicas, além das demências. Se não for cuidada, a tendência é que caminhem para a incapacitação, diz.
Segundo a Ana Amélia, a geração que está entrando agora na fase pós 60 foi beneficiária da redução da mortalidade infantil, dos antibióticos e da vacinação.
Depois, acrescenta a pesquisadora, veio a geração beneficiada pela tecnologia médica, e pelo maior acesso aos serviços de saúde, melhores condições de alimentação, mais saneamento, diz. Há 20 anos, uma ponte de safena só era colocada em hospital de referência. Hoje, qualquer hospital de cidades de porte médio da rede SUS está fazendo isso, compara.
Para o professor Riani Costa, o grande desafio atualmente é chegar antes que a doença se instale. Nesse sentido, na maioria das vezes as medidas passam longe dos remédios, concentrando-se em boas práticas alimentares, melhor qualidade de vida, atividade de trabalho e lazer. Programas de acompanhamento e diagnóstico precoce estão reduzindo os danos do envelhecimento.
O professor lembra que o Pacto pela Saúde, estabelecido em 2006 pelo Ministério da Saúde e as secretarias estaduais e municipais, dão prioridade à promoção da saúde com destaque para a população idosa. Graças a isso tivemos uma ampliação enorme de ações, com a integração de secretarias como as da saúde, do esporte e lazer, do turismo, dos transportes, da educação, inclusive com a participação da universidade, afirma.
Práticas adotadas pela própria Unesp-Unati em Rio Claro e seguidas por outros municípios, estão mostrando que atividades como artes plásticas, teatro, música e o resgate de valores culturais vêm influenciando de maneira positiva o bem-estar e a saúde dos idosos.
Fonte: Valor, em 23/11/2010