A Embraer e a companhia aérea Azul preparam o primeiro voo experimental de um avião de passageiros movido com combustível de cana-de açúcar, num projeto que ganhou novo impulso com a assinatura, durante a visita do presidente Barack Obama ao Brasil, de uma parceria entre os dois países para a o desenvolvimento de bioquerosene de aviação. Em jogo, está a disputa por um mercado estimado em cerca de US$ 300 bilhões no mundo todo, e o interesse estratégico do Pentágono, o maior consumidor de querosene de aviação do mundo, em diversificar as fontes de combustível e de se tornar menos dependente de petróleo.
De acordo com o diretor de Estratégias e Tecnologias para o Meio-Ambiente da Embraer, Guilherme de Almeida Freire, o primeiro teste em voo do bioquerosene, obtido da cana-de-açúcar, será feito em um avião da companhia aérea Azul, na pista que a Embraer construiu, em Gavião Peixoto, no interior de São Paulo, para testar seus aviões em desenvolvimento. A previsão é de que o teste seja realizado no primeiro semestre do ano que vem.
“A Azul será a primeira companhia aérea a utilizar esse combustível no mundo, a partir da rota tecnológica baseada na sacarose. Temos grandes expectativas de que o acordo com o governo americano possa dinamizar o processo de difusão do novo combustível, com a entrada de novos capitais”, diz o presidente da Azul, Pedro Janot.
O biocombustível que a Embraer utilizará em seus aviões comerciais, da família E-Jets, já está em fase adiantada de desenvolvimento nas instalações da empresa americana Amyris, parceira da fabricante brasileira num projeto ambicioso, que também envolve a companhia aérea Azul e a General Electric, produtora dos motores que equipam os jatos brasileiros.
O processo de certificação do bioquerosene da Amyris terá que passar pelo crivo das agências reguladoras da aviação nos Estados Unidos e no Brasil pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). À Agência Nacional de Petróleo (ANP), caberá a autorização para a venda e o consumo do novo combustível, segundo Freire.
A proposta das empresas é oferecer um produto seguro, renovável, estável em termos de custos e que represente uma significativa redução das emissões de gases do efeito estufa em comparação ao querosene de aviação, segundo Freire. Para as companhias aéreas, o novo combustível pode representar mais segurança diante da variação do preço do petróleo, pois o querosene de aviação responde por 30% a 40% dos custos.
O vice-presidente da Amyris, Joel Velasco, afirmou que a companhia investiu cerca de US$ 50 milhões no desenvolvimento do bioquerosene que será utilizado nos jatos da Embraer, mas que tem a pretensão de ser produzido em escala global.
A Embraer iniciou as suas pesquisas sobre o uso de biocombustíveis em 2007. Dois anos depois assinou um memorando de entendimento com as empresas Amyris, GE e Azul para avaliar os aspectos técnicos e de sustentabilidade do novo combustível.
Desde 2005, entretanto, a Embraer produz o avião agrícola Ipanema, movido a etanol, o primeiro no mundo a ser produzido em série.
Pressionadas por regulações mais restritivas sobre a emissão de carbono, as companhias aéreas correm contra o tempo. As alternativas envolvem melhorar turbinas e design dos aviões para aumentar a economia, melhorar a administração dos voos e controle de tráfego aéreo e desenvolver novos tipos de combustíveis. A Iata, uma associação mundial de transporte aéreo, estima que os biocombustíveis possam tomar 6% do mercado, hoje de aproximadamente US$ 300 bilhões, até 2020.
No solo, o querosene de cana-de-açúcar já foi aprovado em uma bateria de testes em laboratório. O plano da Amyris, que tem a empresa francesa de petróleo Total entre seus acionistas, é produzir o combustível em escala comercial até 2015.
A cana não é a única candidata a substituir o petróleo. Em 2008, a Airbus voou com um avião A380 que usa uma tecnologia que transforma gás em combustível liquido. Empresas aéreas, como a Qatar e a United, fizeram experiências semelhantes Também estão sendo desenvolvidos combustíveis de camelina, pinhão manso e soja.
O presidente da Amyris, John Melo, acredita que haverá mais de uma tecnologia vencedora para reduzir a dependência do petróleo, mas reconhece que existe uma espécie de corrida do ouro no segmento. “É como a internet, como o petróleo há 100 anos e todas as novas tecnologias”, afirma o executivo.
“Haverá alguns vencedores e muitos perdedores”, continua ele. “A cana-de-açúcar tem boas chances? “Esperamos ser um dos vencedores”, afirma Melo, que chama a atenção para o fato de que o Brasil tem boa escala e experiência na produção de biomassa. “O Estado de São Paulo é uma espécie de Arabia Saudita da biomassa, com escala, eficiência e baixo custo.”
Fonte: Alex Ribeiro e Virgínia Silveira | De Washington e São José dos Campos
21/03/2011